LIÇÃO 13 – O PODER DA RESSURREIÇÃO

Dr. José Carlos Ramos
D.min., é professor de Daniel e Apocalipse
 

No que consiste o poder da ressurreição de Jesus?

Quando o homem pecou no início, Deus lhe disse: "Maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida." (Gên. 3:17). Embora fale de fadiga, o texto não deixa também de se referir ao poder: o homem seria capaz de arrancar do solo o sustento. Na prática, "sustento" significa mais do que o alimento. De fato, tudo o que o homem tem reunido em sua vida, vem, em última análise, da terra. Alguns reúnem tanto saber, bens e domínio que se sentem soberanos. Numa terra de pecado, porém, não pertence ao homem a última palavra. Ele tem poder para extrair da terra o que quer, mas, finalmente, não para si, pois nada é permanente, nem ele mesmo. "Tu és pó e ao pó tornarás" (v. 19). Poder com transitoriedade é simplesmente irônico e ilusório. Não é verdade que aquele que conseguir superar a morte, terá reunido poder incontestável? Como diz a lição de terça-feira, "Qualquer pessoa que tivesse o poder de ressuscitar os mortos... teria o poder de realizar qualquer outra coisa..."

Alguém disse acertadamente que o cristianismo permanece ou cai com a ressurreição. Sem ela, o Evangelho, "o poder de Deus para a salvação" (Rom. 1:16), seria ineficaz. Como Emile Brunner afirmou, "sem a mensagem da ressurreição de Jesus, a mensagem de Sua morte redentora é nada." (The Letter to the Romans, pág. 132). Outro escritor diz: "Não haveria nenhum evangelho, nenhuma narrativa, nenhuma carta no Novo Testamento, nenhuma fé, nenhuma igreja, nenhum culto, nenhuma oração na cristandade até o dia de hoje." – Günther Bornkamn, Jesus of Nazareth, pág. 181. E tenho dúvidas de que haveria, absolutamente, cristandade ou cristianismo.

Com efeito, Paulo declarou que "se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã, a vossa fé ". (I Cor. 15:14). Isso é perfeitamente lógico, porque se não houve a ressurreição de Jesus, Sua morte não é mais do que isto: decadência, desastre, fim, derrota. Ressuscitando, como de fato ressuscitou, Cristo reinvindicou tudo aquilo que dissera ser, e mais ainda, o significado transcendente de Seu sacrifício. A ressurreição é prova insofismável de que a morte é um inimigo vencido desde aquele solene momento na sexta-feira, quando o Salvador bradou: "Está consumado!"

Domingo – Na sepultura

Se o quarto evangelho é endereçado a uma geração que, tal como a nossa, não testemunhou pessoalmente os eventos ligados a Jesus, é muito significativo o detalhe do "túmulo vazio" no capítulo 20. É-nos dito que o "discípulo amado", uma figura representativa do discípulo ideal (em que pese sua realidade histórica), "creu" que Jesus havia ressuscitado, apenas pelo fato de que o corpo de Jesus não estava lá (v. 8). "Creu" embora ainda não tivesse entendido "a Escritura, que era necessário ressuscitar Ele dentre os mortos" (v. 9). Não é verdade que, em assuntos espirituais, somos convidados a crer sem que tenhamos compreendido cada coisa relacionada com o objeto da fé? Pode acontecer que nunca venha a crer aquele que primeiro exige entender tudo.

Nesse ponto, esse discípulo está em flagrante contraste com Tomé, que precisou "ver para crer" (v. 25). Em outras palavras, não precisamos ser testemunhas oculares para atestarmos a ressurreição. Nós a aceitamos pela fé, segundo o testemunho, nos Evangelhos, daqueles que viram o Cristo redivivo. A fé cristã se expandiu com base nesse testemunho (Atos 5:32).

Todavia, a primeira pessoa a testemunhar a ressurreição não foi o discípulo amado. Este apenas retornou, com Pedro, para casa (João 20:10). Mas Maria Madalena, a mesma que fora perdoada e libertada por Jesus, anunciou aos discípulos: "Vi o Senhor!" (v. 18). Como diz a lição, "a maneira como Jesus tratou Maria mostra Sua grande consideração pelas mulheres. Ele escolheu revelar-Se primeiramente a uma mulher. Então Jesus a incumbiu de ser a primeira pessoa a contar ao mundo que Ele estava vivo". O verdadeiro testemunho não é uma simples exposição teórica daquilo que achamos ou imaginamos ser. Ele se fundamenta em fatos concretos. Jesus não somente havia aparecido à Maria, mas havia novamente tocado sua vida, ao chamá-la pelo nome (vs. 14-16). Não somos testemunhas oculares; mas podemos ser objetos de um toque Seu que faça algo em nós, transformando-nos a vida, por exemplo. Então seremos testemunhas autênticas.

Segunda – No Cenáculo

Deus não requer de nós uma "fé cega". Embora não afaste totalmente os motivos da dúvida, apresenta-nos evidência suficiente daquilo em que devemos exercer fé. Com respeito à ressurreição de Jesus não é diferente. Isso é deveras importante para nós que vivemos a realidade de uma onda cada vez mais crescente de incredulidade em todos os segmentos da sociedade humana. Infelizmente, em um mundo caracterizado pelo secularismo, existe uma tendência cada vez mais forte nos círculos religiosos e teólogicos, com base nas conclusões do moderno criticismo histórico, de se rejeitar a ressurreição literal de Jesus, além de Seu nascimento virginal e milagres que operou.

Mas negar a ressurreição é fechar os olhos à própria realidade do cristianismo. Todo oponente da crença na ressurreição deveria reconhecer que o simples fato da existência da fé cristã é suficiente evidência de que a ressurreição de Jesus realmente ocorreu. Como se viu, sem ressurreição não haveria cristianismo (ver a a parte introdutória da presente lição). Os eventos precedem a fé, não o contrário. De onde veio a Igreja cristã? De uma fraude? Entre os judeus que decididamente rejeitaram a Jesus como o verdadeiro Messias, não haveria sequer um suficientemente capaz de desmascarar a fraude? A tumba estava vazia. Que fim teve o corpo de Jesus? (A lição responde bem às duas hipóteses racionalistas de que inimigos O roubaram, ou os próprios discípulos O esconderam; seria útil repassar este ponto com a classe).

É verdade que a razão humana não pode explicar a ressurreição; esta vai além dela. Mas não pode também negá-la sem transpor seus próprios parâmetros, sem ser incoerente consigo mesma. Como George E. Ladd afirma, "a fé na ressurreição, a certeza de que Jesus estava vivo outra vez, é um fato da História, e aqueles que negam que Jesus ressuscitou dentre os mortos sentem a pressão de tentar explicar historicamente o que causou a crença na ressurreição." (The New Testament and Cristicism, pág. 188). Como foi possível a um grupo de decepcionados, medrosos e reclusos discípulos (ver 20:19) mudar subitamente de comportamento, lançando-se ao mundo para sacudi-lo exatamente com a mensagem da ressurreição? Como a lição pergunta, "quem haveria de sofrer ridículo, tortura e morte por causa de um evento que nunca ocorreu?"

Terça – O poder da ressurreição

A morte de Jesus destruiu a própria morte (Heb. 2:14). Aqui se configura o poder da ressurreição. A partir daquele momento, não mais a morte, mas Jesus, teria, como realmente tem, a palavra final. O triunfo do Calvário foi completo e definitivo. A história da cruz, em virtude da própria cruz, não poderia terminar com a morte de Jesus. A ressurreição no primeiro dia da semana não foi uma complementação ao evento da sexta-feira: foi a conseqüência direta, seu produto natural, necessário, inevitável, final. Simplesmente não há cruz sem ressurreição, como não há ressurreição sem cruz.

Paulo considerava tudo de somenos importância, para, entre outras coisas, "conhecer... o poder da... ressurreição". (Filip 3:10). Claro que ele estava falando de sua experiência cristã. A ressurreição de Jesus não significa apenas que Ele voltou a viver; significa, antes de tudo, que Ele quebrou o poder da morte, abrindo-nos os portais da vida mais excelente, superior, eterna, e isso a partir de agora.

Em João, aquele que crê "tem [não apenas terá, mas tem] a vida eterma" (3:36). O triunfo da cruz, claramente demonstrado na ressurreição, deve ser assumido hoje, e revelado, através de uma nova vida totalmente votada a Deus e à justiça (ver Rom 6:3-13), a um mundo morto em "delitos e pecados" (Efés. 2:1). Com efeito, o mais emocionante de tudo nessa maravilhosa história, é que a vitória de Cristo na cruz não é para Ele apenas, mas para todos os que O aceitam como Salvador e Senhor. "Porque Eu vivo, vós também vivereis" (João 14:19). Isso deve fazer diferença em nosso viver diário (influenciando cada pensamento, palavra e ação), em nossa devoção (oração e estudo da Palavra, pois foi com a ressurreição que os discípulos "creram na Escritura e na palavra de Jesus" [2:22]), e em nosso testemunho (lembre que, em João, o Espírito Santo é outorgado quando Jesus ressuscita, para que os discípulos cumpram um ministério semelhante ao dEle [20:21-23]).

Quarta – A pesca / Quinta – Restaurando Pedro

Já foi referido que o capítulo 21 funciona como um apêndice do quarto Evangelho (ver comentário à lição de 30 de dezembro). Este capítulo foi inserido ao corpo principal do livro para explicar a morte do discípulo amado em relação à expectativa da volta de Jesus (v. 23). Outro motivo: informar aos leitores como ocorreu a reintegração de Pedro. Este havia negado o Mestre, e é até possível que houvesse na comunidade joanina, ao final do I século, membros que pusessem em dúvida a sua genuinidade apostólica; precisavam, assim, desta informação.

O milagre relatado nesse capítulo está em paralelo com aquele dos Sinóticos, conhecido como "a pesca maravilhosa" (Mat. 4:18-22; Mar. 1:16-20 e Luc. 5:1-11). São, naturalmente, dois milagres distintos, sendo o segundo praticamente uma duplicação do primeiro. Os contextos fazem a diferença. Enquanto o primeiro ocorre no início do ministério de Jesus, e concorre diretamente para o chamado dos discípulos, o segundo ocorre alguns dias antes do início do ministério da Igreja, e confirma a missão que a Igreja tinha pela frente, e ainda tem, e teria que cumprir com a liderança inicial dos apóstolos. O êxito na pesca é símbolo do êxito do cumprimento da missão, e mais uma vez observamos que João deixa entrever que a experiência de Cristo é a experiência de Seus seguidores. Aquilo que nos Sinóticos apontava mais diretamente para o êxito do ministério de Cristo (do qual os apóstolos participariam), aponta agora para o êxito do ministério da Igreja, que ela cumprirá sob a direção do Espírito (ver comentário à lição 11, principalmente a parte introdutória).

E este ministério aparece aqui na perspectiva do Cristo ressurreto. A ressurreição é a garantia da vinda do Espírito e, portanto, do poder que impusionará a Igreja. Mais uma vez, estamos diante do "poder da ressurreição".

Bem analisada, a ressurreição de Jesus reúne pelo menos quatro decisivas implicações para o cumprimento do imperativo evangélico: (1) a ressurreição ratifica o trato salvífico de Deus com a raça perdida, o que comunica substância à missão e sintetiza sua própria razão de ser. Simplesmente não se pode proclamar salvação quando não há salvação; (2) a ressurreição conduz a uma compreensão cristológica mais ampla de Jesus. Ela é o ponto central de onde uma nova dimensão do conhecimento de Cristo é alcançada. Como diz o já citado Bornkamm, "é o Cristo ressurreto quem primeiro revela o mistério de Sua história e Sua pessoa, e, acima de tudo, o sentido de Seu sofrimento e morte". (pág. 185). Se o ponto (1) substancia a missão, este agora lhe dá conteúdo, substancia a própria mensagem que a Igreja tem de proclamar; (3) a ressurreição (e aqui a morte de Cristo também está envolvida) abre caminho para uma experiência pessoal da salvação provida pelo evangelho. É por isso que o Novo Testamento define a conversão em termos de morrer e ressuscitar com Cristo (Rom. 6:3 e 4). É este fato que levará a Igreja a não proclamar o evangelho como simples teoria, mas como algo concreto, cuja eficácia é comprovada em sua própria vida; e (4) a ressurreição é uma fonte de poder para a Igreja (Col. 3:1). Devido à exaltada posição que o Cristo ressurreto ocupa no Céu, Ele pode colocar ao alcance dela todos os recursos do reino de Deus. É também por isso que, em João, a dotação do Espírito, como já foi observado, ocorre logo após a ressurreição, justamente para o cumprimento da missão (João 20:21 e 22). Ao sair para proclamar a mensagem divina ao mundo, a Igreja pode ter certeza de que o poder do Alto estará com ela.

Sugestivamente, Jesus disse aos apóstolos pescadores que lançassem a rede para o lado direito do barco (v. 6). Por que o lado direito? Porque "daquele lado estava Ele, na praia. Era o lado da fé. Se trabalhassem em ligação com Jesus – combinando-se Seu divino poder com o esforço humano deles – não deixariam de ter êxito". – O Desejado de todas as Nações, pág. 811.

O diálogo de Jesus com Pedro confirma o que Ellen G. White diz. Três vezes ele havia negado a Jesus. Três vezes Jesus lhe pergunta: "Amas-me mesmo, Pedro?" As duas primeiras vezes ele respondeu afirmativamente, dando prioridade ao conhecimento de Cristo: "Tu sabes que Te amo". Na terceira vez, ele realçou ainda mais este conhecimento: "Tu sabes todas coisas, Tu sabes que eu Te amo" (21:15-17). Não era mais o impulsivo Pedro em sua auto-suficiência e autodependência que o levavam a cingir-se e andar por onde queria (v. 18). É verdade que ele continuava impulsivo (como ficou demonstrado um pouco antes, ao ele se atirar do barco e nadar rumo à praia [v. 7]), mas estaria agora a serviço do Mestre, e sob Seu controle.

A cada resposta do discípulo, Jesus o encarregou de uma participação em Sua obra. Em outras palavras, ele estava sendo reintegrado no grupo apostólico. Mas ele só poderia cumprir cabalmente a sua missão seguindo fielmente a Jesus: "Segue-Me" (v. 22).

Seria diferente conosco hoje? É evidente que não. "Seja qual for nossa posição, dependemos de Deus, que enfeixa em Suas mãos todos os destinos. Ele nos designou nossa obra, e nos dotou de faculdades e meios para ela. Enquanto submetermos a vontade à Sua, e confiarmos em Sua força e sabedoria, seremos guiados por caminhos seguros, para realizar a parte que nos cabe em Seu grande plano. Aquele, porém, que confia em sua própria sabedoria e poder, se está separando de Deus." – Ibidem, pág. 209).


RETORNAR